23 HISTÓRIAS CLÁSSICAS - 3 - CAPUCHINHO VERMELHO
Se há contos clássicos que têm sido propícios às mais variadas (e, por vezes, delirantes) versões, o “Capuchinho Vermelho” é seguramente um dos principais. Também esta é uma história com raízes na tradição oral, identificável em vários pontos da Europa e cuja primeira fixação em livro foi efetuada pelo francês Charles Perrault na última década do século XVII.
Pouco mais de um século depois, faria parte igualmente da
recolha publicada pelos Grimm, numa versão muito semelhante, mas em que o final
se distingue profundamente. O texto dos irmãos germânicos é basicamente aquele
que conhecemos hoje em dia, com o caçador a chegar no momento certo para resgatar
a avó e a neta da barriga do lobo. Em Perrault, porém, o conto terminava abruptamente
depois de conversa entre a menina e o lobo que estava deitado na cama: “E
dizendo estas palavras, o malvado do lobo atirou-se ao Capuchinho Vermelho e
comeu-o”.
Por aqui se vê como os textos têm vindo a ser acrescidos de
finais cada vez mais felizes e mais à medida do público – e não, não é apenas
uma moda do século XX.
Curiosamente, o francês acrescenta no final do conto, como
era seu hábito, uma moralidade que revela de forma clara que esta história era
uma alegoria sobre os cuidados que as raparigas deviam ter em relação aos
homens e o seu assédio.
Com o passar do tempo e o arredondamento das arestas do
texto, o “Capuchinho Vermelho” perdeu para os leitores alguma dessa conotação,
tendo sido enfatizada, de alguma forma, a figura do Lobo Mau associada ao
próprio animal, visto como um dos mais perigosos predadores a viver próximo das
comunidades humanas na Europa.
Daí que muitas das recriações feitas nas últimas décadas
tenham servido precisamente para relativizar a figura do lobo, em especial de
modo a valorizar o papel deste animal nos ecossistemas. Mas o enredo de base
presta-se também a reescritas mais arrojadas, por exemplo concedendo à Capuchinho
modos sedutores e trocando tudo do avesso. Claro que aqui já não estamos em
registos dirigidos ao público infantil, mas a verdade é que na origem eles
também não o eram, até porque o conceito de criança estava ainda longe de
existir tal como hoje o entendemos.
Estando a história disponível em inúmeras edições, é a ousadia
das ilustrações que hoje pode fazer a diferença, daí que vos mostre como imagem
este “Um Capuchinho Vermelho”, de Marjorie Leray (responsável também pelo divertido
texto), e que foi editado em Portugal pela Orfeu Negro.
Capa de “Um Capuchinho Vermelho”, de Marjorie Leray |
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